quinta-feira, 25 de março de 2010

João Gilberto ao vivo

Ouvi o disco de João Gilberto ao vivo em Montreaux, no qual o artista toca canções famosas, como Sem Compromisso. Algumas delas são, nos discos de estúdio, curtinhas, entre um ou dois minutos, mas ao vivo elas são executadas em quatro, até seis minutos, com a repetição de suas pequenas estrofes. Ouvindo pela primeira vez pensei "isso deve ser muito chato ao vivo, a musica curtinha repetindo, repetindo".
Aí pesquisei sobre os shows de Joãozinho (pra me amansar), e li um produtor dizendo que o artista cria um clima "de catedral" ao vivo, e isso me bateu. Voltei pro disco e entendi o que o cara disse. Realmente, o músico faz a música ir além, transcende a simples voz e o simples violão. Há algo mais que isso. Há algo mais do que voz e violão ali, naquele momento. Como um quadro de Pollock, em que há mais do que quadro e tinta: existe um elemento extra, invisível. Tem algo ali mais do que quadro e tinta.
Como na música Sem Compromisso, a repetição da pequena letra de novo e de novo cria quase que uma dissociação das palavras, a genialidade transforma a letra em algo mais, algo além, somado a batida de violão. Me lembrei então dos mantras, que criam um estado contemplativo pela repetição de palavras. Claro, João não esta apenas repetindo algo, mas interpreta a canção. Também não tem nada a ver com o Deus da igreja, que tem música e até rock para os rebanhos, digo, fiéis.
De qualquer forma, a arte tem essa natureza transcendental, de transformar o comum em além-comum. A profunda beleza da música (para mim em especial a ao vivo que capta o momento presente da execução e as nuanças em que isso implica) leva a um prazer sutil, quem sabe pelo abandono ou transmutação do comum.

"Se um músico estiver tocando,
se um pintor estiver pintando,
se uma pessoa dança com a alma,
se alguém estiver inteirado em algo,
fique pertinho, quietinho e aberto,
pois Deus, por certo,
está rondando por ali"
Osho

GUSTAVO.

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